quarta-feira, 12 de novembro de 2008

“... por causa da mulher cuxita (etíope)...”.


Releitura do texto de Números 12.1
A mulher cuxita como se lê no livro bíblico de Números é apresentada como natural da região de Cuxe onde se encontra um povo de pele negra. De acordo com Gn 2.13, o rio Gion do jardim do Éden rodeia a terra que se estende até a região atualmente conhecida como África. Existem ainda outras citações bíblicas sobre Cuxe: Em Gn 10.6-9 os cuxitas são descendentes de Cam, filho de Noé; e também no livro de Isaias (45.14), sendo considerado nesse livro como uma nação militar e comercialmente poderosa.
Originária desse povo forte e poderoso, a mulher cuxita é citada na bíblia apenas uma vez e como esposa de um grande líder israelita, que pela segunda vez casa-se com uma estrangeira. Segundo uma lenda judaica, antes de Moisés fugir para o deserto de Midiã, participou de uma campanha egípcia contra Etiópia. A filha do rei etíope teria se apaixonado por ele, o que resultou no casamento de ambos. Trata-se de uma lenda entre histórias românticas, porém interessante para ser lembrada. No entanto a primeira esposa de Moisés é da terra de Mídiã, assim a lenda não é legitimada pelo texto bíblico segundo o qual a mulher etíope foi à segunda esposa.
“Mirian e Arão começaram a criticar Moisés porque ele havia se casado com uma mulher etíope.” (Num. 12.1). No texto sagrado, encontram-se murmurações dos irmão de um líder israelita. Os mesmos apresentaram a ele a causa de tantos problemas ocorridos com o povo, como fome e doenças. A mulher etíope foi acusada de ser o fator responsável pelas adversidades. O que essa mulher pode ter feito ou representado para essas pessoas ao ponto de a acusarem de ser a causa de tantos problemas? Qual a ligação entre a fome, às doenças do povo e aquela mulher? O fato é que precisavam encontrar algum motivo para julgar a liderança de seu irmão Moisés. Em meio às discursões familiares e à busca pelas causas dos problemas do povo, encontra-se uma mulher misteriosamente apresentada nas entrelinhas, nas poucas palavras de alguém que considerou importante mencioná-la.
O fato de ser estrangeira não era suficiente para justificar a acusação, pois a primeira esposa de Moisés também era de outro povo, mas apenas a segunda é citada como pivô da discursão o que confronta uma explicação étnica. Então o que realmente causou aquela desavença? É interessante o fato de que a profetiza Miriã e seu irmão Arão, encontraram na mulher etíope uma ameaça. Talvez muito mais ligada à inveja e competição pela liderança do povo, devido a forte influência espiritual que os acusadores exerciam.
“Será que o Senhor tem falado apenas por meio de Moisés? Perguntaram. Também não tem ele falado por meio de nós?” Eles demonstram no texto um descontentamento com a monopolização do poder dado por Deus a Moisés, é claramente apresentada uma insatisfação e inquietação por serem lideres secundários.
A busca pelo poder durante a peregrinação do povo fez com que os irmãos de Moisés tivessem aversão à sua segunda mulher. No texto Miriã e Arão não falam diretamente das dificuldades como sendo fruto de conselhos ou da influência daquela mulher. Porem suas ações e palavras levam a pensar que essa mulher poderia ser consideravelmente influente na direção da liderança junto com Moisés. É estranho que se relacionem as desgraças meramente com sua etnia ou a inveja dos irmãos de Moisés, ao ler o texto com olhos críticos, nas entrelinhas, os detalhes oferecem algo mais. Assim a presença de personagens como a mulher cuxita aponta para o fato de que junto com o povo israelita, se encontravam outros povos que juntos participariam da busca pela terra prometida, unidos por um só Deus, construindo uma só história e essa questão pode ser também considerada uma das causas da discursão dos irmãos.
“E o Senhor ouviu isso.” As linhas posteriores da história bíblica de acusação, trazem um Deus que com justiça interfere de maneira clara e objetiva falando de seus propósitos para com Moisés e o porquê de seus irmãos estarem errados em seus questionamentos (Num 12.4-9). Assim podemos afirmar que junto com ele estava sua esposa, legitimada por Deus e sem nenhuma culpa.
A mulher etíope é mais uma grande personagem na narrativa bíblica. Uma heroína negra, historicamente resgatada por alguém que não esqueceu de mencioná-la e a registrou num momento importante e decisivo para o povo de Yahweh. Como outras e outros lideres sufocados por interesses políticos e por preconceito e discriminação. É preciso resgatar a memória desses que sofrem, sendo acusados de situações nas quais estão para construir e agregar.

Dalila: Traição ou compromisso com seu povo?


Releitura do texto de Juizes 16. 4-24

Lembro quando criança das histórias da bíblia que me contavam, uma delas foi a de Dalila. Na verdade ela sempre foi uma das protagonistas do lado mau da história junto com outras mulheres. Conheci Dalila como a mulher que traiu um nazireu consagrado à proteção do povo israelita. Relendo a vida dessa mulher descobri que a história pode não ter sido bem assim.
Do vale de Soreque encontramos Dalila, aquela que encheu os olhos de um líder israelita. O mesmo não podia casar-se com uma estrangeira e pela segunda vez assim fez. O povo filisteu encontrou nesse casamento uma oportunidade de destruir aquele homem que tanto o angustiava. Imagino o dilema dessa mulher, apoiar seu povo ou deixar que seu marido continuasse a humilhar os seus? No decorrer da história fica claro que sua decisão foi estar do lado dos filisteus, firmou compromisso com seu povo.
Dalila, com muita coragem iniciou sua missão, desafiando seu marido a lhe contar onde estava sua força. Por vezes ele mentiu, mas um dia cedeu à insistência de sua mulher e contou a ela seu segredo. Usada pelo deus dos filisteus, a coragem de Dalila salvou o seu povo de um homem que se divertia com a humilhação e com as mortes que causava (Jz 16. 24).

Sempre considerei as mulheres do povo de Israel maravilhosas e as de outros povos terminantemente proibidas de serem exemplos de honra. Agora me questiono porque os israelitas tinham tanta aversão às mulheres estrangeiras e que diferença tão séria havia entre elas? Revisando alguns conceitos bíblicos, concluí que outras nações possuem suas próprias histórias, seus líderes, heróis e heroínas dign@s de respeito e admiração.